quinta-feira, 27 de setembro de 2012

LEI DE ACESSO VAI PEGAR?



















ZERO HORA 27 de setembro de 2012 | N° 17205


Lei de Acesso ainda patina. Negativa da Assembleia Legislativa em fornecer dados de CCs ilustra dificuldade do setor público em detalhar informações


ADRIANA IRION E RODRIGO MÜZELL


Quatro meses depois de entrar em vigor, a Lei de Acesso à Informação ainda está longe de ser cumprida com eficiência. Atrasos, burocracia para registrar pedidos, pouca disposição de agentes públicos e falta de clareza nos critérios adotados para negar informações são alguns dos problemas.

Dos 104 pedidos feitos por Zero Hora desde o dia 16 de maio, quando a lei 12.527 começou a valer, apenas 44% foram respondidos de forma completa. As dificuldades se repetem em todas as esferas de governo, mas um caso verificado na Assembleia Legislativa ilustra como a lei ainda custa a ser respeitada.

Durante os últimos três meses, ZH tentou obter junto à Assembleia a lista dos funcionários com cargos em comissão (CCs) autorizados a trabalhar fora da sede do parlamento, assim como os locais onde cumprem suas funções. A lista não foi fornecida.

A administração da Assembleia, que gasta em torno de R$ 6,8 milhões mensais com CCs, diz desconhecer quem pode atuar fora da Casa. Segundo a Mesa Diretora, apenas os gabinetes dos deputados e das bancadas têm a informação detalhada.

Mas quando ZH fez o pedido aos 55 gabinetes e às 11 bancadas, o presidente do parlamento, Alexandre Postal (PMDB), reagiu. Disse à reportagem que os parlamentares estavam “brabos” por terem sido demandados.

Apenas o gabinete do deputado Alexandre Lindenmeyer (PT) forneceu os dados: os parlamentares acabaram acertando que a Mesa responderia por todos. Com base na afirmação do superintendente de Comunicação Social da Assembleia, Marcelo Villas-Boas, de que “deputado individualmente não é parte para ser inquirido pela lei”, Postal definiu:

– Não se pode impor a um deputado prazo para dar informação. Tem de pedir para a Casa. A Mesa vai responder dentro do nosso regramento.

Somente 20 dias depois, o superintendente-geral da Casa, Fabiano Geremia, enviou um e-mail em resposta, no qual não consta a informação solicitada. ZH recorreu e a Mesa Diretora, novamente, respondeu sem dizer os nomes dos CCs e onde trabalham. Na mensagem, Geremia sustenta que “as informações fornecidas foram completas, não tendo havido qualquer recusa a informações mantidas pela Administração deste Parlamento.”


No Exterior, início difícil

Mesmo com seis meses de prazo para preparar a implantação da Lei de Acesso à Informação, raros órgãos públicos brasileiros se organizaram para atender os cidadãos. Segundo especialistas, isso é comum: a mudança mais profunda a ser provocada é cultural.

– Uma lei não muda um hábito de 300 anos de idade, de o governo manter para si as informações – diz o norte-americano Charles Davis, diretor da Coalizão Nacional pela Liberdade de Informação e professor da Universidade do Missouri.

Nos EUA, as leis de liberdade de informação existem desde os anos 1970. Segundo Davis, o processo de implantação foi semelhante: no início, não havia estrutura, treinamento e disposição para fornecer dados.

Na Inglaterra, a pesquisadora da ONG Campaign for Freedom of Information, Katherine Gundersen, diz que, apenas com a contestação da imprensa e de organizações civis, foram definidas regras mais claras sobre o que é público e o que é privado, como no caso dos salários.

– Só com insistência da sociedade os governos foram repassando mais dados – conta a inglesa.

Segundo o especialista da FGV-SP Fabiano Angélico, em casos de dúvida, o espírito da lei deixa claro que a preferência é pela divulgação.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Toda Lei não aplicada pela justiça não pega e se torna inútil como se não existisse. A Lei de Acesso só vai pegar quando o Poder Judiciário e o Ministério Público quebrarem suas próprias resistências e assumirem as responsabilidades que lhes cabem na consolidação da democracia. No Brasil, os Poderes Legislativo e Executivo não cumprem a lei porque o Poder Judiciário não tem força para se incompatibilizar com o poder político.

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