Foram disponibilizados na internet vencimentos de 130 mil servidores ativos, mas o sistema não permite cruzamento de dados
JULIANA BUBLITZ
JULIANA BUBLITZ
O Palácio Piratini divulgou ontem, na internet, os salários de julho de mais de 130 mil servidores ativos, mantendo seus nomes em sigilo e optando por um formato fechado. Mesmo com o abate-teto, que não incide sobre as chamadas vantagens eventuais, 410 deles ganham salários brutos que superam o limite de R$ 24.117,62, adotado pelo governo gaúcho.
As vantagens eventuais incluem, por exemplo, férias, serviços extraordinários, substituições e abonos de permanência. Com base nesse recorte, o mais bem pago de julho foi um “Técnico II” da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), que recebeu R$ 37.897,47 brutos.
O básico dele não passa de R$ 6.886, mas as vantagens pessoais chegaram a R$ 10.739,17 e as eventuais alcançaram R$ 20.272,30. Ele não teve nenhum centavo estornado, porque o abate-teto não atinge as vantagens eventuais, e, sem elas, o seu salário bruto ficou em R$ 17,625,17 – abaixo dos R$ 24,117,62.
Entre os detentores dos 50 maiores salários, estão 35 agentes fiscais do Tesouro. Mesmo sem contar os benefícios eventuais, eles continuam à frente. Na lista também aparece um piloto de Aeronaves da Brigada Militar, que ganhou R$ 28.482,86 brutos.
O ranking foi elaborado por ZH, já que o site não oferece uma base de dados comum, que permite o livre manuseio de dados. Ao contrário do que prega a Lei de Acesso à Informação, o Piratini optou por disponibilizar 58 arquivos separados, em formato estanque. Para driblar o problema, foi preciso abrir todos os documentos e exportar os números para outro programa. Sem isso, seria impossível fazer a compilação.
Responsável pelo site, a subchefe de Ética, Controle Público e Transparência, Juliana Foernges, garante que o sistema será aprimorado. A conversão para “dados abertos”, segundo ela, terá início na próxima semana:
– Sabemos que o formato atual não é o ideal. Fizemos o que foi possível, mas vamos trabalhar para melhorar.
Além dos impedimentos técnicos, ficaram faltando informações sobre servidores inativos e sobre órgãos como o IPE, o Daer, a Superintendência de Portos e Hidrovias e a Superintendência de Portos de Rio Grande.
PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA
Sob medida para ocultar
A divulgação dos salários do Executivo estadual, feita ontem pelo Palácio Piratini, revela o esforço do governo para impedir que os valores sejam associados às pessoas que os recebem. Nem a matrícula do servidor, como chegou a ser cogitado, aparece nos documentos. É a transparência às avessas: o cidadão que quiser fiscalizar a existência de distorções terá imensa dificuldade para manusear as listas que o governo colocou na internet.
O governador Tarso Genro já tinha avisado que só divulgará os nomes dos servidores quando houver decisão irrecorrível do Supremo Tribunal Federal. Tarso se alinha com os que consideram a divulgação dos nomes uma afronta à Constituição, contrariando o entendimento do Conselho Nacional de Justiça e do próprio Supremo, que votou pela transparência total ao analisar o caso da prefeitura de São Paulo.
Para chegar à lista das maiores remunerações e confirmar que a Secretaria da Fazenda concentra os salários mais elevados do Executivo, Zero Hora teve de cruzar cada uma das listas divulgadas no site e montar uma planilha de Excel que, mesmo assim, pouco revela. Porque embora a remuneração seja desdobrada, não se sabe, por exemplo, a que “eventuais” a lista se refere, nem se esses “eventuais” não são pagos regularmente.
Como não foram divulgados os proventos dos inativos, ficou fora da lista o agente da Susepe que, até onde a vista alcança, tem o contracheque mais alto entre os milhares de servidores do governo do Estado.
Ontem, o Tribunal de Contas do Estado, instituição que mais teceu loas à transparência, divulgou a remuneração dos servidores e membros ativos e inativos da instituição e do Ministério Público de Contas. Sem os nomes, para não constranger. A alegação é de que, como “existe um debate legítimo em torno da ideia de privacidade protegida tanto pela Constituição Federal quanto pela própria Lei de Acesso à Informação, a conduta mais prudente, por ora, é a divulgação de todos os detalhes das remunerações, sem os respectivos nomes”.
ALIÁS
A relação de salários divulgada pelo governo Tarso Genro é tão hermética, que fica difícil identificar as distorções, mas permite confirmar o que já se sabia: se a Secretaria da Fazenda é o paraíso, a da Educação pode ser chamada de purgatório.
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O Rio Grande do Sul se firma como o Joãozinho do passo certo: todos os poderes se uniram para interpretar a Lei de Acesso à Informação com um olhar diferente do governo federal e do Supremo Tribunal Federal.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Se o Estado é o primeiro a não acatar uma lei, o que esperar do povo, dos corruptos e da bandidagem em geral? A lei de acesso é mais uma que o Estado tente mascarar com o jeitinho brasileiro. A tabela apresentada é mais uma prova dos privilégios de alguns setores do serviço público com poder de barganhar salários extravagantes agregando direitos adquiridos sem obedecer o teto previsto em lei. Além deles aparecem servidores que ganham salários bem acima do que ganham servidores da mesma categoria. A falta dos nomes constrange estes servidores que ganham menos da metade. É também demonstração da discriminação do Estado para com aqueles que prestam serviços em áreas vitais do direito social como saúde, educação e segurança. Caiu a máscara da instituição que mais prega a falência do Estado: a Secretaria da Fazenda, onde se concentram os salários mais elevados do Executivo
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