segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

O ESTADO TEM O DIREITO DE OCULTAR DESPESAS?


O Estado de S. Paulo 05 de janeiro de 2013 | 20h 10

O Estado tem o direito de ocultar despesas com os cartões corporativos?


Percival José Bariani Junior, professor de Direito Administrativo na PUC-SP


SIM. A Constituição, no art. 5º, inciso XXXIII, assegura a todos o direito de receber dos órgãos públicos informações de interesse particular ou geral, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. O princípio da publicidade não é absoluto, tanto que o art. 23 da Lei Federal 12.527/2012 regulamenta o acesso, discriminando as informações cujo acesso é restrito e limitando a atuação do administrador ao classificar um dado como sigiloso.

Nesse sentido, desde que sejam obedecidos os parâmetros normativos, não é ilegal classificar como sigilosa uma despesa realizada via cartão corporativo, devendo tal classificação ser realizada por autoridade de nível ministerial, mediante despacho fundamentado. Isso ocorre, por exemplo, com despesas da Presidência e Vice-presidência da República, Polícia Federal e Ministério da Justiça, entre outros - conforme dispõe o art. 45 do Decreto 93.872/86. Nosso ordenamento jurídico, assim, atribuiu aos administradores públicos a competência para fazer a ponderação entre o princípio da publicidade e a necessária segurança da sociedade.

Por certo que o controle, pelos cidadãos, é limitado, sendo-lhes facultado, apenas, recurso à Controladoria-Geral da União.


Claudio Weber Abramo, diretor executivo da Transparência Brasil

NÃO. Os donos de todo o dinheiro gasto pelo poder público não são os agentes do governo, mas os cidadãos, em nome dos quais as despesas são realizadas. Logo, como todo o dinheiro é nosso, não há justificativa para que sejamos mantidos na ignorância a respeito de como ele é gasto.

Ainda que, por motivos estratégicos, se relaxe um pouco tal consideração em casos excepcionais, tais situações são assinaladas no Orçamento, que é aprovado pelo Congresso.

A realização dos gastos correspondentes passa pelo processo administrativo normal, chamado "ordenamento de despesa". Nenhum gasto pode ser "ordenado" se não estiver previsto explicitamente no Orçamento. Não é o que acontece com cartões de crédito. Estes são instrumentos importantes para agilizar despesas correntes de pequeno valor, como compra de material de escritório, combustível e assim por diante.

É para isso - e apenas para isso - que os cartões servem. Eles não se prestam para despesas "estratégicas". O "ordenador" de uma despesa paga com cartão é o portador do cartão. O mecanismo administrativo que autoriza a despesa fica ao arbítrio do chefe da repartição, sendo feito a posteriori. É poder demasiado, o que sempre implica risco de arbitrariedade.

Em 2008, cartões corporativos renderam CPI's

Governo federal aumentou em 129% suas despesas com dinheiro eletrônico. Carlos Eduardo Entini, - 05 de janeiro de 2013 | 13h 17



O Estado de S. Paulo, 13/1/2008



O Estado mostrou nesta reportagem o aumento de 129% nos gastos com os cartões corporativos do governo federal em relação ao ano anterior, 2006. No total pulou de R$ 33 mil para R$ 75,6 mil. Na lista dos ministros que mais gastaram estava a da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro. Os gastos da ministra, que pediu demissão do cargo, chegaram a R$ 171,5 mil.

Em 31 de janeiro o governo reagiu. Para conter os abusos, anunciou restrição dos saques em dinheiro e a proibição da utilização dos cartões para pagamento de viagens e diárias. A reportagem também revelou que a maior parte dos R$ 71 mil foi com saques.

Em 21 de fevereiro é criada a CPI dos cartões mista, com deputados e senadores, com período de investigação a partir de 1998, no governo Fernando Henrique Cardoso. Em março, a CPI esquenta quando surge um planilha produzida na Casa Civil com os gastos do ex-presidente FHC e sua esposa, Ruth. O secretário de controle interno da Casa Civil, José Aparecido Nunes Pires, é apontado pela PF como principal suspeito do vazamento do dossiê. Funcionário de carreira do Tribunal de Contas da União (TCU), Aparecido foi levado para a Casa Civil pelo ex-titular da pasta, José Dirceu.

Após pedir exoneração do cargo, Aparecido depõe à CPI e alega que enviou 'por engano' a planilha, e isenta Dilma e Erenice Guerra, (braço direito da ministra) de culpa na elaboração do documento. O episódio do vazamento revelou disputa dentro da Casa Civil entre o grupo de Dirceu e de Dilma, como revelou o Estado na reportagem 'Vazamento de dossiê contra FHC abre guerra dentro da Casa Civil' .

O dossiê levou à criação de outra CPI, agora no Senado. Em junho a CPI mista chega ao fim. Ninguém foi indiciado, e em 139 páginas de relatório, fora os anexos, Luiz Sérgio (PT/RJ) não reconheceu a existência de irregularidades com o uso do cartão corporativo.


O Estado de S. Paulo, 6/6/2008




Dilma Roussef foi absolvida na Comissão de Ética da Administração Federal que arquivou processo sobre o suposto dossiê. Segundo o Presidente da Comissão, Sepúlveda Pertence, Dilma explicou que fez um banco de dados com muito mais informações que as extraídas e publicadas.

São Paulo. A falta de transparência com cartões corporativos não se restringiu ao governo federal. O governo de São Paulo, também em 2007, registrou R$ 108,4 mil o total de gastos com cartões. Quase a metade do valor, R$ 48 mil, era de saques em dinheiro.



O Estado de S. Paulo, 8/2/2008


Os cartões corporativos foram introduzidos no governo FHC. O objetivo era facilitar a transparência dos gastos antes feitos por meio de apresentação de notas fiscais, um procedimento de prestação de contas menos transparente.

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